26 janeiro, 2015

Dos merecimentos



Uma palavra é pouco pra quem espera por um dicionário inteiro. Um acorde parece nada pra quem espera uma orquestra tocando uma sinfonia em sua homenagem. Uma música é insignificante pra quem espera por um CD de 15 faixas. Uma pétala é pouco pra quem quer um jardim. O mundo parece nada pra quem quer o universo à sua disposição.

Tem tanta gente sendo feliz com pouco. Em compensação, há pessoas que sofrem por querer demais, que não se contentam com o que tem ou não tem. Com o que lhe é permitido possuir, com o que merece receber em troca.

Seria um desperdício dar uma constelação inteira pra quem não sabe apreciar o brilho de uma estrela solitária. Ninguém deveria desmerecer um sorriso cheio de carinho porque esperava uma declaração com palavras e orquestra. Quem não ouve sinos tilintando quando vê a pessoa que gosta não pode receber dela mais do que oferece. As pessoas querem aplausos quando, na verdade, deveriam aplaudir.

Todos merecem receber a luz dos holofotes uma vez ou mais que duas vezes na vida. Todos merecem ser amados de verdade, receber carinho aos montes; se não conseguir ter um poema ou um conto em sua homenagem, ao menos alguém que tenha a coragem de escrever uma carta do modo antigo, com caneta e papel – sabe-se que são poucas as pessoas que se mostram através de sua caligrafia num mundo tão digital.

Os que chegam ao topo de elevador não conhecem os benefícios de construir uma escada com degraus seguros. Ninguém deve oferecer mais do que tem, nem deve ganhar mais do que precisa. Não falo de comunismo, socialismo ou comunidade fraterna. Falo de bom senso, de ser sensível consigo mesmo e com o outro.

Se a grama do vizinho é sempre mais verde, deve ser porque ele cuida dela e ela entende que deve retribuir dessa forma. É hora de olhar pra grama que cresce desordeiramente no nosso quintal.